Disponibilizamos às/aos nossas/os leitoras/es a Análise de Conjuntura Nacional realizada pelo GOI, com data de 15/9/2021. Vamos publicá-la em três partes.
A economia do país tende, na melhor das hipóteses, a seguir estagnada nos próximos meses. A tão anunciada recuperação pós-pandemia, na realidade se mostrou pífia. Os economistas já falam em estagflação, que significa a combinação de estagnação econômica com alta inflação. Isso não dará trégua aos males que assolam a classe trabalhadora: arrocho salarial, desemprego e subemprego, jornadas de trabalho estafantes, aceleração dos cortes de direitos e da precarização do trabalho, sucateamento dos serviços públicos (Saúde, Assistência Social, Moradia, Saneamento, Educação, etc.). E a nova crise hídrica já anunciada. A hipótese pior seria um agravamento da recessão, o que não pode ser descartado.
Os principais dados econômicos são os seguintes:
PIB (projeções da MB Associados): 2020: -4,1%; 2021: 4,7%; 2022: 1,4%. [https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/09/01/pib-do-brasil-recua-01percent-no-2o-trimestre.ghtml]
Desemprego/Subemprego (pesquisa IBGE, julho/2021): 33 milhões de trabalhadores subutilizados, assim subdivididos:
14,8 milhões de desempregados (2 milhões a mais que em maio de 2020): pessoas que não trabalham, mas procuraram empregos nos últimos 30 dias;
7,4 milhões de subocupados (1,6 milhão a mais que em maio de 2020): pessoas que trabalham menos de 40 horas por semana, mas gostariam de trabalhar mais;
10,8 milhões de pessoas na força de trabalho potencial (1 milhão a menos que em maio de 2020), composta por pessoas que poderiam trabalhar mas não trabalham: este grupo inclui 5,7 milhões de desalentados (300 mil a mais que em maio de 2020), ou seja, que desistiram de procurar emprego, e outras 5,1 milhões que podem trabalhar, mas que não têm disponibilidade por algum motivo, como mulheres que deixam o emprego para cuidar dos filhos. [https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/09/01/pib-do-brasil-recua-01percent-no-2o-trimestre.ghtml]
Salários (dados DIEESE): Mais da metade dos reajustes salariais (52,3%) ficou abaixo da inflação (INPC-IBGE) no primeiro semestre, só 16,5% tiveram ganhos reais, enquanto 31,2% dos reajustes foram equivalentes à variação da inflação. Dados se referem a cerca de 4.700 acordos e convenções coletivas realizadas no 1º semestre de 2021. [https://www.redebrasilatual.com.br/economia/2021/07/reajustes-salariais-perde-inflacao-primeiro-semestre/]
Cesta básica (dados DIEESE): o custo da cesta básica já é, em todos os estados, de cerca de metade do valor do Salário Mínimo. Em São Paulo, a cesta básica custa R$ 650,50, 63,93% do Salário Mínimo. [https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/09/08/cesta-basica-ja-consome-ate-65percent-do-salario-minimo-mostra-dieese.ghtml]
Estes elementos econômicos refletem não apenas uma crise conjuntural, mas também uma crise estrutural da economia do país, a decadência de suas forças produtivas e do peso relativo do Brasil no conjunto da economia capitalista mundial. Expressões desta decadência estrutural são: a desindustrialização e volta à dependência das exportações primárias (agroindústria, minérios), a queda da participação no PIB mundial.

A crise provoca o aumento da concorrência no interior da burguesia, com empresas e até setores inteiros indo à bancarrota (por exemplo, as empresas do complexo automotivo afetadas pelo fechamento da FORD). Num capitalismo cada vez mais parasitário, a crise acirra a luta entre as diferentes frações da burguesia pela disputa das benesses e proteção do Estado, (privatizações, investimentos, liberação de pagamento de impostos, exploração da Amazônia e das terras indígenas, etc.). A principal forma de parasitismo dos capitalistas nacionais e imperialistas sobre os recursos do estado é a dívida pública, que consome quase 40% dos recursos do Orçamento Federal, o que equivale a R$ 1 trilhão, 381 mil reais, fortuna que é desembolsada anualmente para os banqueiros e agiotas nacionais e imperialistas. A aplicação destes recursos em investimentos públicos para a melhoria das condições de vida do povo pobre e trabalhador poderia dar um salto na qualidade de vida da população. Mas, o pagamento em dia desta dívida é garantido pelas “vacas sagradas” da doutrina econômica burguesa-imperialista: a Lei de Responsabilidade Fiscal, o Teto de Gastos, e as “reformas” (trabalhista, previdência, administrativa, etc.) e privatizações que desmantelam os serviços públicos e os serviços de proteção social (previdência, seguro saúde, SUS, etc.).

O peso da crise é descarregado sobretudo sobre as classes subalternas: o proletariado e a pequena burguesia.
Na sociedade capitalista sempre existiu um elevado contingente de trabalhadores sem direitos, submetidos a condições de trabalho sub-humanas, além de um grande setor de desempregados. A crise crônica do capitalismo torna o desemprego de milhões de pessoas algo estrutural na sociedade. Estes contingentes da classe trabalhadora alternam períodos de emprego e desemprego, ora como assalariados precarizados, ora como autônomos, ora como desempregados. A maior parte da juventude trabalhadora das gerações mais recentes vive nesta situação. A profissão mais emblemática deste contingente tem sido os entregadores por aplicativos. A destruição dos direitos trabalhistas e dos estatutos de carreira do funcionalismo público e de estatais faz crescer exponencialmente o número de trabalhadores precarizados, em todos os setores da economia. Apenas para dar um exemplo, na categoria de professores da rede estadual de São Paulo, segundo a Apeoesp, 57,1% dos professores da Educação Básica I e 34,3% da Educação Básica II são precarizados.
O processo de destruição e precarização vem se dando pelo menos desde os governos de FHC (PSDB), nos anos 1990, quando foram feitas as primeiras leis de “flexibilização” da CLT (banco de horas, contratos temporários) , a primeira “reforma” da Previdência ( que acabou com a aposentadoria por tempo de trabalho) e a privatização de várias estatais (Vale do Rio Doce, Telebrás, CSN e outras). Nos governos da frente popular (Lula e Dilma) esse processo se desacelerou, mas os governos de coligação do PT com a burguesia mantiveram as medidas antioperárias aprovadas nos governos de FHC, e Lula fez mais uma “reforma” da Previdência (atacando principalmente o funcionalismo público). Com a estalido da crise capitalista em 2008, a burguesia se viu na necessidade de dar um salto nos ataques à classe trabalhadora. Dilma retomou os ataques diretos à CLT no segundo mandato, e as dificuldades de seu governo para acelerar as “reformas” antioperárias exigidas pela burguesia foram uma das razões de seu afastamento do poder. Com o golpe de 2016, sob Temer, a burguesia afundou o pé no acelerador das “reformas”, com a aprovação de 3 leis: a do Teto de Gastos (que congela os salários do funcionalismo e a realização de concursos); a das Terceirizações e a “reforma” Trabalhista. Bolsonaro se elege com o lema “mais empregos e menos direitos”, e dá sequência aos ataques de Temer, com a nova “reforma da Previdência” (que praticamente decretou o fim da aposentadoria para as novas gerações), as leis de redução de salários durante a pandemia, e agora avança para a privatização dos Correios e da Eletrobras, a “reforma” Administrativa, o Marco Temporal, a Minirreforma Trabalhista, Carteira Verde Amarela e inúmeros outros decretos e projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional.
É importante destacar que todos os setores burgueses, sejam pró-Bolsonaro ou “oposição” a ele, estão unidos na defesa da política econômica antioperária de Bolsonaro-Guedes, que, como vimos, dá continuidade aos ataques que vêm dos governos anteriores. A demolição de nossos direitos é realizada também pelos governadores (PLC 26, de Dória) e prefeitos (fim do 14° salário do funcionalismo em Taboão). E o STF e todas as instâncias do Poder Judiciário sacramentam estes ataques.
A pequena burguesia é assolada também, à sua maneira, pela crise e decadência do país: a insegurança econômica permanente causada pelos ciclos de crescimento e recessão, a concorrência dos grandes monopólios, o peso das dívidas bancárias e dos impostos, a falência dos pequenos negócios, o que leva ao desespero causado pela destruição de seus sonhos de ascensão social, etc.
Resumindo, a crise crônica do capitalismo mundial, a decadência estrutural do país, a estagnação econômica que se arrasta desde a crise mundial de 2008, estão na base da luta de classes que se aprofunda no país, dos enfrentamentos entre as frações da burguesia, da instabilidade, desespero e mobilização da pequena burguesia e do descontentamento e raiva crescente do proletariado, que até este momento está contido pela política traidora de suas direções.