Por que a volta às aulas presenciais não é segura

Alex Viana

Em vários programas de televisão a discussão do retorno às aulas presenciais aparece como se fosse uma simples questão de opinião. O conjunto de trabalhadores da educação e de estudantes sabem que nenhum ensino remoto pode substituir seus imprescindíveis trabalhos presenciais. Muito menos um ensino remoto cuja plataforma só foi acessada por 47% dos estudantes da rede estadual de São Paulo, até maio de 2020. Em outras palavras, um ensino remoto que excluiu mais da metade dos estudantes da rede estadual de São Paulo do acesso à educação.

O problema é que o Governo de João Dória não quer investir o necessário para oferecer aos 3,5 milhões de estudantes da rede estadual de São Paulo um ensino público, gratuito e de qualidade. Não garantiu um ensino remoto emergencial que poderia ter sido muito melhor, garantindo os materiais de acessibilidade à internet necessários aos estudantes e professores, que tiveram de se virar para garantir acesso com seus recursos particulares. Agora a situação se agrava, pois também não investe o suficiente para garantir um retorno às aulas presenciais seguro, o que coloca milhões de vidas em risco.

Ao contrário do que afirma o Secretário da Educação, Rossieli Soares, as e os trabalhadores da educação sabem que o retorno às aulas presenciais no atual momento e nas atuais condições de trabalho não garantem uma volta às aulas presenciais segura. Pois está expondo a vida das e dos estudantes, professores, funcionários e seus familiares ao vírus da COVID-19, ao jogar esses profissionais e estudantes em condições de trabalho e estudo insalubres. Os governos de todos os estados do Brasil não implementam políticas efetivas para controlar a pandemia de COVID-19 no país, pois estão comprometidos com os interesses de lucro dos patrões. Enquanto o governo Bolsonaro incentiva as e os trabalhadores a continuarem trabalhando sem isolamento ou medidas sanitárias, para garantir esses mesmos lucros. O resultado disso é que nos últimos 30 dias o Brasil está registrando mais de mil mortes por dia. Ou seja, estão abrindo as escolas em uma situação de total descontrole da pandemia de COVID-19 no país.

Mal a primeira semana de aulas começou, os dados do próprio governo de São Paulo mostram que 741 casos de COVID já foram registrados nas escolas do Estado de São Paulo, sendo 456 somente nas escolas da rede estadual. É importante lembrar aqui que esses dados, que já são absurdos, ainda são subnotificados, ou seja, o número é ainda absurdamente maior. Pois, há vários relatos de trabalhadores da educação afirmando que gestores de escolas, sob orientação do governo, escondem criminosamente os casos de COVID-19 que ocorrem em suas escolas.

Esse é o resultado de impor de cima para baixo uma volta às aulas em meio ao descontrole da pandemia de COVID-19 e sem garantir uma infraestrutura mínima nas unidades escolares, que estão cada vez mais sucateadas. Sucateamento que é o resultado de um projeto político de desinvestimento e privatização do ensino público da rede estadual de São Paulo. Projeto que está sendo implementado por décadas de gestão do PSDB no governo do Estado de São Paulo, alinhado com os interesses de empresas que mercantilizam a educação. Em escolas sucateadas não há a possibilidade de garantir o cumprimento de medidas sanitárias mínimas que, por sua vez, garantam a saúde e o bem estar das e dos estudantes, trabalhadores da educação e seus familiares.

As situações nas escolas são precárias. Assim como no ensino remoto, as e os trabalhadores da educação e estudantes têm de se virar para garantir um mínimo de segurança no local de trabalho e estudo. Os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) não são oferecidos aos professores, funcionários e estudantes, que têm de garanti-los com seus cada vez mais escassos recursos financeiros. Não há álcool em gel suficiente, com potes distribuídos em todas as salas de aula, e também estão sendo trazidos de casa. Os banheiros continuam sem nem sequer papel higiênico e sem reformas. Os vitrôs são emperrados e insuficientes para garantir circulação de ar nas salas de aula. A maior parte das escolas só têm dois funcionários da limpeza, que não têm condições para garantir a higienização adequada entre os turnos, um serviço oferecido por empresas terceirizadas e executado em geral por duas mulheres com contratos de trabalho temporários. Os professores afastados das atividades presenciais por fazerem parte do grupo de risco não estão sendo substituídos por novas contratações, portanto, estão faltando professores, e para “resolver” o problema as e os gestores de escolas estão juntando e enchendo as salas de aula com estudantes e desrespeitando o limite máximo permitido de estudantes pelo protocolo sanitário criado pelo próprio governo. As saídas de turno das e dos estudantes continuam sendo no mesmo horário para todas as salas de aula, produzindo cenas de aglomerações entre as e os estudantes. Em muitas escolas as aulas continuam sendo 7 aulas de 45 minutos por turno diariamente, o que aumenta o tempo de exposição ao vírus e não garante um tempo suficiente para a adequada higienização das salas de aula no período de troca de turno, que tem de ser feita em apenas 25 minutos por apenas duas funcionárias da limpeza.

A falta de estrutura se estende para o transporte público, que continua uma aglomeração, situação piorada com as e os estudantes tendo de ir trabalhar e estudar cada vez mais longe de casa por causa da implementação das escolas de tempo integral. Em resumo, é o terreno propício para a disseminação do vírus da COVID-19 e o adoecimento e morte das e dos trabalhadores da educação, estudantes e seus familiares.

Diante da situação absurda descrita acima, não se pode ficar esperando a doença se espalhar entre as e os estudantes e trabalhadores da educação e seus familiares, é necessário um ensino remoto de qualidade já. Pois essa é única medida que neste momento pode assegurar a saúde e a educação da juventude trabalhadora. O ano letivo se recupera, vidas não. A única medida 100% segura contra a COVID-19 até o momento é o isolamento social. Até a pandemia da COVID-19 estar controlada, por meio da vacina ou por meio de um efetivo isolamento social, o retorno às aulas presenciais só servirá para aumentar o genocídio eugenista em curso, que já tirou mais de 2,4 milhões de vidas no mundo, onde o Brasil ocupa o inaceitável lugar de 2º país com maior número de mortes.

Diante da atual situação de descontrole da pandemia de COVID-19 no Brasil, defende-se aqui a necessidade de um lockdown (paralisação das atividades econômicas) urgente, com auxílio emergencial de 1 salário mínimo para todas e todos os trabalhadores que precisarem. Pois entende-se aqui que essa é a única ação política que coloca a vida acima do lucro e pode assegurar que as e os trabalhadores não tenham de escolher entre a morte por COVID-19 ou pela fome.

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