As e os ativistas que constroem a CasaNem, um espaço de acolhimento para pessoas LGBTTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, transexuais, travestis, queers, interssexuais, assexuais e outras grupos de orientação sexual e identidade de gênero) em vulnerabilidade social, em uma luta que já dura 5 longos anos, arrancaram do poderio público uma importante vitória através de sua luta e resistência. Utilizando os métodos de autodefesa da classe trabalhadora com as ocupações que realizaram em prédios abandonados do Rio de Janeiro, para abrigar LGBTTQIA+ em situação de rua, muitas das quais abandonadas à própria sorte por suas famílias, elas peregrinaram por todos esses anos de uma ocupação à outra. Após terem sido expulsas, no dia 24/8, da ocupação “Stonewall-Inn/CasaNem”, em um prédio abandonado há mais de 10 anos em Copacabana, sob forte aparato policial, hoje as e os ativistas poderão dormir mais tranquilos/as e em um novo lar.
Vale ressaltar que sua conquista foi fruto não da benevolência dos que estão no poder, ou mesmo da justiça dos ricos, que sempre foi subserviente ao poder público, emitindo mandados de reintegração de posse contra as ocupações, mas da batalha que estes heróis e heroínas travaram para garantir seu direito à moradia. Estes e estas ativistas e militantes mostraram a importância dos métodos de luta da nossa classe: resgataram as barricadas, usaram seus corpos violentados, marginalizados, explorados e oprimidos, fizeram cordões humanos para se defender e defender suas ocupações. Enfrentaram a repressão da polícia, prisões arbitrárias, como a que sofreu Indianarae Siqueira, líder do movimento, na última semana, além da violência de grupos de extrema direita, que diariamente ameaçavam suas vidas.
Contando apenas com o apoio e solidariedade de outros ativistas, movimentos e organizações de trabalhadores e trabalhadoras Brasil a fora, puderam garantir na luta o acordo que lhes fez obter essa importante conquista: um local digno e seguro para morar.
O GOI sempre apoiou, se solidarizou e divulgou a luta das e dos camaradas. Sem dúvida alguma, estamos e queremos continuar na mesma trincheira com estes e estas ativistas que lutam, se organizam e resistem a exploração e as péssimas condições de vida a que os capitalistas nos impõem, sobretudo aos setores mais explorados e oprimidos de nossa classe, como são os e as LGBTTQIA+.
Será através de lutas como esta que fizeram as e os ativistas da CasaNem que poderemos construir um novo tipo de sociedade, que nós, revolucionários socialistas, acreditamos ser a sociedade onde possamos ser “socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”, nas palavras da revolucionária alemã, Rosa Luxemburgo, que morreu lutando por estes ideais.
Reproduzimos abaixo a nota oficial*** da Casa Nem sobre esta importante vitória, que serve de exemplo não apenas para nossas lutas cotidianas mínimas, como empregos, salários e direitos, mas também para as lutas maiores que devemos travar contra nossos algozes: a burguesia e seus governos genocidas, como de Crivella, Witzel e Bolsonaro.
Saudamos as e os camaradas da CasaNem e cada ativista e militante que fez parte desta luta e desta conquista. Que ela nos fortaleça para seguirmos lutando por um mundo mais justo, livre de todo tipo de preconceito, exploração e opressão!
“Agora é oficial!
Depois de uma luta de quase 5 anos em uma união de vários movimentos sociais, costurando acordos e trabalhando em conjunto com os poderes públicos, onde foi necessário traçar um caminho da Lapa na Rua Morais e Vale 18, ocupando o Automóvel Clube do Brasil, no Passeio Público, em uma ocupação cultural nesse que foi o primeiro congresso nacional desde que o Brasil se tornou república, passando pela ocupação Denise em Botafogo na R. General Polidoro, descendo pra fortalecer a ocupação de Vila Isabel, se unindo a FIST e indicando como nome uma homenagem a cantora Elza Soares, expulses fomos pra Bonsucesso fortalecer a Ocupação cultural Olga Benário, que precisava de ajuda. Fomos pra R.Ramalho Ortigão temporariamente no centro, ocupamos por uma noite um imóvel na Rua da Carioca pra que as pessoas da CasaNem descansassem de suas andanças ao pôr do sol pra que ao raiar do dia pudéssemos juntes, sem largar as mãos dos que ficavam, mas entendendo quem ficava no meio do caminho e pra esses deixávamos a provisões e a promessa de um dia teremos nosso lugar e viremos te buscar ou você poderá nos encontrar onde estivermos.
Chegamos à Copacabana pra flertar durante um tempo com a Princesinha do Mar em um prédio da R . Dias da Rocha, um dos primeiros a ser construído em Copacabana, onde um acervo de obras de arte foi encontrado e devolvido ao IPHAN, Museu Nacional e Policia Federal. E parecia que por termos prestades um serviço à sociedade, nos dariam esse local. Limpamos e organizamos o prédio. Fomos sementes e levamos a presença de Marielles, Dandaras, Xicas Manicongos, Giselle Meirelles, Demétrios, João W.Nery, por onde fomos e sem perceber já nos dávamos em fruto, em pão, alimento, em água pra matar a sede dos afogados pelo abandono.
Fomos tantes e uma força nos unia: a sobrevivência nutrida pela esperança de um mundo melhor, mas não só pra nós e sim por todes. E, de repente, quando o mundo parou e um vírus mortal atacou a humanidade. A morte nos rondava no ar ao respirar. Mas para a CasaNem não lhe foi permitido parar e lhe foi exigido além do que parecia ser possível. E enquanto as pessoas pareciam perdides, a CasaNem chamou para si a responsabilidade de proteger os mais vulneráveis, sem esquecer os animais não humanes. Formou-se então uma rede onde as Casas de Acolhimento LGBTIA+ foram chamadas a formarem a REBRACA LGBTIA+ .
A fome apertava e a gente achava que não daria conta. Mas estamos dando e não chegamos lá sozinhes. CasaNem provou que um outro mundo é possível através da rede de colaboradores (colabores) e amigues. Durante essa pandemia distribuímos mais de 3500 cestas com Kit de higiene e limpeza, 20 mil máscaras de proteção, quentinhas e roupas pra alimentar e proteger moradores de rua, com ração pros animais de estimação e acolhendo alguns desses animais. Está sendo exaustivo. E depois de muita luta se não era possível estar a duas quadras de uma das praias mais famosa do mundo. Atacavam-nos outra vez.
As forças policiais chegaram e era necessário resistir. Resistimos e a organização levou a um acordo em frente às câmeras de televisão, os órgãos públicos foram chamados: ou fazíamos um acordo pacífico ou lutaríamos até a nossa última gota de sangue. Então nos escondemos por trás de barricadas prontas a explodir. Do lado de fora os portões tinham os corpos de manifestantes que começam conosco uma vigília. Entre a promessa de ir pra Laranjeiras, restava à alternativa da Escola Estadual Pedro Alvares Cabral como provisório, até que o Governo do Estado do Rio de Janeiro encontrasse um local pra CasaNem. Aceitamos o acordo.
Ao chegar à escola já sabíamos que estaríamos sobre ataques de uma vizinhança que já é hostil aos estudantes do local. Vizinhança que nos atacou com cabeças explosivas de fogos de artifícios e aos animais de estimação acolhides. Sem mandato a policia invadiu o local e levou a pessoa responsável detida como se quisesse humilha-la mais uma vez.
Foram muitas lutas e toda luta pra assim ser chamada precisa de adversários e esses foram muitos. E parecia que nos espreitavam a cada curva. E nós só queríamos saber depois da curva ali o que tinha pra nós. Então esperamos e depois da curva logo atrás do castelinho vês nos encontrarão à beira mar do bairro do Flamengo. Pra quem já teve tantas incertezas. Pra quem já passou fome. Pra quem a vida tirou todas as possibilidades e ainda assim espera o temporal passar e sorri pra que vocês possam nos encontrar ali depois da curva como um pote de ouro no fim do arco-íris.
Quando perguntarem à vocês e depois da curva hein? Respondam: Tem a CasaNem com viado, sapatão, transvestigenere, transagenere, gates, cachorres e putes de luta. Logo ali. Depois da curva do túnel, ali na rua 2 de Dezembro, n° 09. Convidamos vocês a nos visitar quando a tempestade da pandemia passar.
“Nós somos sementes de Marielle que brotaram contra Bolsonaro”.
#CasaNemCasaViva
Rio de Janeiro, 11 de Setembro de 2020.”
***Na nota feita pela CasaNem, vocês poderão notar que algumas palavras não estão no masculino ou feminino. O “o” e o “a” de algumas palavras são sempre substituídos pelo “e”. Este é o modelo de linguagem neutra de gênero. Este tipo de linguagem busca se livrar do binarismo imposto pelos gêneros tradicionalmente aceitos pela sociedade (masculino e feminino), visando uma comunicação mais inclusiva, respeitosa e abrangente.
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