A vitória do capitão Bolsonaro nas eleições de outubro é uma derrota da classe trabalhadora e dos setores mais pobres e oprimidos do povo brasileiro. A ascensão de Bolsonaro ao poder, somada ao fortalecimento dos elementos da ultradireita no Congresso Nacional, particularmente a chamada “bancada BBB” (bala, boi e bíblia), fortalece o conjunto da burguesia exploradora nacional e imperialista, que tem como solução para a crise do Brasil uma receita simples: o aumento da exploração e da opressão das classes dominadas. Bolsonaro tem agora a missão de transformar sua vitória eleitoral numa arma para derrotar a classe trabalhadora na luta de classes, nas greves e manifestações.
A formação do governo, que está em curso, as primeiras medidas que pretende implementar junto com Temer em seu final de mandato, e as relações internacionais já anunciadas por Bolsonaro, não deixam margem a dúvidas sobre o caráter antioperário e pró-imperialista do novo governo.
Os nomes indicados para o “gabinete de transição” e os futuros ministros já anunciados tornam mais evidentes os contornos do novo bloco de forças políticas que estará à frente do estado burguês nos próximos quatro anos.
O banqueiro Paulo Guedes, futuro chefe do “superministério” da Economia (fusão dos atuais ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio) é um bilionário que fez fortuna através da especulação financeira nas bolsas de valores e com títulos do governo. Fundador do Banco Pactual e da Bozzano Investimentos, investe também em redes de ensino e empresas de saúde privadas. É economista formado pela Escola de Chicago, catedral do ultraliberalismo, na qual se formaram os famosos “chicago boys” que conduziram a economia nas ditaduras militares de Pinochet, no Chile, e de Videla, na Argentina. Curiosamente, da mesma escola é também o banqueiro Joaquim Levy, que foi ministro da Fazenda de Dilma e implementou ataques ao seguro desemprego, pensões e PIS. Guedes é, portanto, um legítimo representante dos setores rentistas mais parasitários e pró-imperialistas da burguesia brasileira, que retomam plenamente o comando da economia do país para aprofundar o “ajuste imperialista” através das privatizações, cortes de investimentos sociais e direitos trabalhistas, precarização do trabalho, arrocho salarial e desemprego.
A outra estrela do novo gabinete é o juiz Sérgio Moro, o outro “mito” da “luta contra a corrupção”. A “Operação Lava Jato”, comandada por Moro e seus amigos do Ministério Público e da Polícia Federal, foi o principal instrumento utilizado para a derrubada do governo Dilma, para a perseguição política ao PT, a prisão de Lula e posterior cassação de sua candidatura à presidência, enquanto mantinha livres os notórios corruptos dos grandes partidos burgueses como Temer, Aécio, Alckmin e o próprio Bolsonaro. As manobras jurídicas e policiais de Moro foram decisivas para abrir caminho à vitória de Bolsonaro, o que revela o caráter ilegítimo do novo governo, mesmo nos marcos das regras da atual democracia corrupta dos ricos. Por este papel político que vem cumprindo no último período, não é nenhuma surpresa que Moro seja agora recompensado com o “superministério” da Justiça e que vá cumprir um papel chave no governo da ultradireita. Moro terá agora plenamente à sua disposição a Polícia Federal e outros órgãos de repressão do estado e já começou a montar sua equipe com seus amigos da Lava Jato: juízes, procuradores do Ministério Público, policiais federais e outros representantes da casta de parasitas do poder Judiciário. Os métodos ilegais e autoritários que utilizou como juiz serão agora utilizados pelo ministro para reprimir as organizações e lutas da classe trabalhadora e do povo pobre e para perseguir e prender os ativistas dos sindicatos e movimentos: a manipulação das leis, as prisões preventivas ilegais para forçar o comércio de “delações premiadas”, os vazamentos seletivos de depoimentos e os espetáculos das operações da Polícia Federal mostrados ao vivo pela Rede Globo. Com Moro, Bolsonaro coloca em prática a sua ameaça de “acabar com o ativismo”.
Outro pilar do governo Bolsonaro é a equipe de generais que o vem assessorando há alguns anos, o chamado “grupo de Brasília”, que indicou 25 dos 50 nomes do “gabinete de transição”. Deste grupo fazem parte o vice “boca aberta”, general Mourão, e o discreto general Augusto Heleno, que assumirá o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e integrará o “núcleo duro” do governo. Heleno, ex-comandante das tropas brasileiras de repressão no Haiti e implacável opositor da demarcação de terras indígenas, defende também a ideia autoritária de que “ direitos humanos são para os humanos direitos”. Certamente, reserva para si e para a elite racista, machista, lgbtfóbica, xenófoba e corrupta, da qual faz parte, a identificação de quem são estes “humanos direitos”. Estes generais, recém-saídos das sombras a que foram relegados desde a derrubada da ditadura militar, retornam ao centro do poder pelas mãos de Bolsonaro, expressando o avanço do militarismo no país.
Para completar este quadro das “forças vivas da nação”, não poderiam faltar os interlocutores com o Congresso corrupto, papel para o qual foi designado o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM), que deve assumir a pasta da Casa Civil, de onde vai gerenciar o “toma-lá-dá-cá” com seus pares do “baixo clero” da Câmara de Deputados. Onyx, corrupto confesso, foi citado por Moro em uma entrevista como exemplo de político, por ter se “arrependido” dos seus crimes de corrupção e que isso já bastava como punição a ele. É a confissão pública de Moro de que sua “justiça” segue a velha regra dos coronéis: “aos amigos, tudo, e aos inimigos, a força implacável da lei”!
Ainda sem pasta, deve também ter lugar no novo governo o “braço direito” de Bolsonaro, Magno Malta, representante da bancada da bíblia, ou seja, dos exploradores da religiosidade do povo pobre e oprimido.
A confluência desta confraria de agiotas, parasitas, brucutus, corruptos e velhacos que vão compor o governo autoritário do capitão Bolsonaro consolida o avanço da ultradireita militarista e fascista e da hegemonia das facções burguesas ligadas à especulação financeira e ao agronegócio no país. Este fortalecimento vem se dando principalmente desde o “Coxinhaço”, as manifestações que derrubaram o governo Dilma em 2015, e se apoia no giro à direita da pequena burguesia e da “classe média”, que arrastou consigo os setores mais atrasados política e culturalmente do proletariado. Esta base de massas do bolsonarismo é fruto da desilusão da classe trabalhadora, da pequena burguesia e da “classe média” com os governos da Frente Brasil Popular e da falência da política de colaboração de classes do PT e de Lula.
As portas abertas de Temer ao “gabinete de transição” e, sobretudo, a ofensiva que Bolsonaro já iniciou nas poucas semanas que restam do mandato do atual governo para aprovar a “reforma” da Previdência e outros projetos patronais e autoritários, como o “Escola sem partido”, mostram que o governo Bolsonaro é uma continuidade do governo Temer, evidentemente piorada e mais perigosa. O jornal Correio Braziliense noticiou que Bolsonaro deve presentear Temer com o posto de embaixador na Itália, pelos seus “bons serviços” prestados à nação.
A identificação ideológica e política, e o mimetismo das tuitadas do presidente dos Estados Unidos, já valeram a Bolsonaro o apelido de “Trump tropical”, evidenciando o seu pleno alinhamento com o imperialismo ianque. A submissão colonial aos Estados Unidos não é nenhuma novidade em nosso país, e o caráter pró-imperialista é a marca fundamental dos governos burgueses, atenuada apenas nos breves períodos de enfrentamentos tímidos e parciais que marcaram os governos de Getúlio Vargas e João Goulart. Este caráter pró-imperialista se manteve nos governos da frente popular encabeçados pelo PT. Lula garantiu religiosamente o pagamento da dívida pública às grandes corporações financeiras, socorreu com dinheiro público as multinacionais instaladas no país (principalmente as montadoras de automóveis), coroando seu servilismo ao “amigo” George Bush com o envio de tropas militares brasileiras para dirigir a missão militar da ONU no Haiti (Minustah), fachada de ajuda humanitária que esconde seus verdadeiros objetivos de repressão do povo haitiano e garantia dos interesses da dominação imperialista naquele país.
A “novidade” é o alinhamento de Bolsonaro a Israel, estado racista, usurpador e opressor do povo palestino, enclave imperialista no Oriente Médio. Na verdade, o estreitamento de relações comerciais e políticas com Israel avançou significativamente no governo Temer, particularmente nos setores do agronegócio (irrigação), de gestão de águas e armamentista. Bolsonaro, que visitou Israel em 2016, além de ter sido “rebatizado” nas águas do rio Jordão, deixou estabelecido em reuniões com o governo de ultradireita de Netanyahu e empresários israelenses o compromisso de estreitar relações entre os dois países. Já declarou que vai transferir a embaixada brasileira para Jerusalém, somando-se à provocação ao povo palestino feita por Netanyahu e Trump. Netanyahu, que se reuniu com Temer em setembro passado, já anunciou sua presença na cerimônia de posse de Bolsonaro.
Os capitalistas manifestam seu entusiasmo com o novo governo fazendo saltar os índices da bolsa de valores. A pequena burguesia patriótica e a “classe média branca e pura” que protagonizaram a campanha de mentiras, insultos e violência de Bolsonaro deposita todas as suas esperanças no novo governo. Mas, os trabalhadores e trabalhadoras que votaram em Bolsonaro, enganados por seu falso discurso patriótico e moralista, vão começar a enxergar a verdadeira face patronal e antipovo do novo governo. O mesmo tende a ocorrer com os extratos inferiores da pequena burguesia e da classe média, que esperam de Bolsonaro a solução de seus problemas.
Os setores mais conscientes da classe trabalhadora que combateram o bolsonarismo dando mais de 31 milhões de votos às candidaturas de Haddad, Boulos e Vera Lúcia, no primeiro turno das eleições, e mais de 42 milhões de votos a Haddad no segundo turno, devem agora seguir a luta no terreno da mobilização, das greves e manifestações contra os ataques que já foram retomados por Temer e Bolsonaro. É preciso reunificar a classe trabalhadora, unir seus setores de vanguarda à sua retaguarda, para defender nossos salários, empregos, direitos trabalhistas e democráticos. Para isso, temos de impulsionar a frente única das organizações da classe trabalhadora e do povo pobre e oprimido que começou (tardiamente, que se diga!) a se formar no segundo turno contra Bolsonaro (Ele Não!) para eleger Haddad, organizando-a pela base e para a luta nas greves e nas ruas. Não devemos dar nenhuma trégua a Bolsonaro e iniciar desde já o combate a este governo ilegítimo, nascido das manobras do impeachment e da operação Lava Jato.
A organização da frente única proletária depende, antes de tudo, da política dos partidos que falam em nome da classe trabalhadora: PT, PC do B, PSOL, PSTU e PCB. Manifestações importantes ocorreram em algumas capitais logo após as eleições, convocadas pela Frente Povo sem Medo. As centrais sindicais, reunidas em 1/11, se prontificaram a retomar a luta contra a “reforma” da Previdência. Mas, para fazer avançar a unidade da classe trabalhadora é preciso rechaçar a política das direções do PT e do PC do B de formar uma “frente ampla de oposição” com partidos como o PDT e o PSB, e políticos burgueses como Ciro Gomes, Márcio França, Renan Calheiros e outras nulidades políticas. Estes já mostraram, com sua abstenção covarde diante de Bolsonaro no segundo turno, que não servem de nada para a defesa das liberdades democráticas, menos ainda para a defesa dos direitos da classe trabalhadora.
O PSOL, o PSTU, o PCB, o MTST e a Frente Povo sem Medo, partidos e organizações que se mantêm independentes da burguesia, devem exigir dos partidos majoritários, PT e PC do B, que rompam seus pactos políticos com a burguesia e impulsionem a unidade política da classe trabalhadora e do povo pobre e oprimido, sem patrões.
É preciso passar das palavras à ação, organizando pela base o enfrentamento ao novo governo. O GOI reitera a proposta e o chamado a estas direções para que organizem um Encontro Nacional de Base com a participação dos sindicatos e movimentos de luta, com delegadas e delegados eleitos nos locais de trabalho, estudo e moradia, para traçar um Plano de Lutas e organizar comitês unificados pela base contra os ataques de Bolsonaro e as ameaças da ultradireita militarista e fascista.
(Nota do GOI – 9/11/2018)