Por C. Pedroso e R. Pereira
Vivemos um período crucial na História. A crise do sistema capitalista que se espalhou pelo globo desde 2008 vem cada vez com mais frequência retirando e atacando direitos históricos da classe trabalhadora. Os agentes capitalistas no Estado burguês (o executivo, o legislativo, o judiciário e os militares), para recuperar os danos causados pela crise, usam dos mais diversos métodos e argumentos para aprovar e justificar os ataques sobre a classe trabalhadora. Um dos setores que mais tem sofrido com a perda de direitos é a educação pública, cujo meio é utilizado pela grande maioria de nossa classe para alcançar conhecimento e exigir direitos.
Ataques em escala internacional
Não é de agora que @s trabalhador@s da educação e a juventude vêm se dando conta da necessidade de enfrentamento ao desmonte da educação pública e à retirada de direitos, como corte de salários, subvalorização das carreiras d@s educador@s, falta de infraestrutura nas escolas, superlotamento das salas de aula, desvios de verbas da educação, merenda escolar e até dos uniformes dos estudantes, etc. O século XXI está marcado de lutas e exemplos de resistência em defesa da educação.
O México segue ainda abalado pela experiência da Comuna de Oaxaca e a luta mortal travada pel@s trabalhador@s da província em meados de 2006, num dos exercícios revolucionários mais importantes deste século. No mesmo ano, o Chile serviu de exemplo para estudantes de todo o mundo. A popularmente conhecida “revolta dos pinguins” (apelido dado aos estudantes chilenos por seus uniformes) levou os secundaristas a ocuparem suas escolas contra o desmonte e a precarização dos serviços prestados pelo governo. A experiência chilena e sua radicalização foram essenciais para a organização e a luta dos secundaristas de São Paulo contra o fechamento das turmas e escolas pelo governo Alckmin, em 2015, e os do Paraná, em 2016, que fizeram uma das maiores ocupações de escolas do mundo contra a reforma do ensino médio de Michel Temer. Foi também o setor da educação quem deu um dos primeiros recados ao governo neoliberal de Macri, em 2017, quando trabalhador@s tomaram conta das ruas de Buenos Aires contra os planos antioperários para a Argentina, dando o tom de como seria o enfrentamento da classe trabalhadora nas ruas.
São inúmeros os exemplos de lutas travadas pelo setor da educação em todo o mundo. Dos estudantes universitários franceses, que se somaram às mobilizações da classe trabalhadora no início do último mês, contra a reforma do ensino de Macron. Da juventude que impulsionou fortes mobilizações na Nicarágua contra a Reforma da Previdência do governo de Daniel Ortega, abrindo uma crise no governo da Frente Popular Sandinista. Das mobilizações históricas ocorridas no final de abril nos Estados Unidos, com greves massivas de trabalhador@s da educação. Das greves d@s educador@s do Amazonas e do serviço público municipal de São Paulo (que contou com a educação como vanguarda), que saíram vitoriosas. Além da solidariedade internacionalista ativa do movimento com as várias lutas da categoria contra a retirada de direitos, a exemplo do que fizeram os estudantes e professores das universidades inglesas em luta, se posicionando contra a reforma de Dória e a truculência da GCM/PM.
Repressão, arbitrariedades, assédio e perseguições contra trabalhador@s: lutar não é crime!
Para aplicar os planos do imperialismo a nível nacional, estadual e municipal, os governos, além de retirar direitos econômicos e socais da classe para sustentar o pagamento da dívida aos agiotas e banqueiros nacionais e internacionais, têm também aprofundado os ataques sobre os direitos democráticos conquistados em lutas passadas pela classe trabalhadora. A repressão tem sido utilizada para intimidar, criminalizar e desmobilizar as lutas de nossa classe.
No México, os anos seguintes à luta d@s educador@s de Oaxaca foram de dura repressão aos movimentos que se organizaram para lutar por direitos, com sequestros e assassinatos políticos, noticiados mundialmente, como o assassinato d@s 43 estudantes de Iguala, em 2015, além do famoso caso da ativista e feminista Beatriz Cariño, assassinada na província de Oaxaca, em 2010, após denunciar a violência de grupos paramilitares. Toda semelhança com o caso de Marielle Franco no Rio de Janeiro não é mera coincidência.
Recentemente, no dia 23/04, em Belo Horizonte, pouco mais de um mês depois de Dória (PSDB) ter covardemente reprimido a manifestação d@s servidor@s públic@s municipais de São Paulo, assistimos a educação e o serviço público serem tratados novamente com truculência e arbitrariedades. Mesmo em um protesto pacífico, reivindicando a equiparidade de salários com o ensino fundamental (uma promessa eleitoral do prefeito, inclusive), trabalhador@s da educação infantil mineira foram brutalmente reprimid@s pela guarda municipal de Alexandre Kalil (PHS) e pela PM do governo estadual de Fernando Pimentel (PT). Sem pensar duas vezes, Pimentel, que há pouco tempo havia reprimido também uma manifestação d@s trabalhador@s da rede estadual, mandou a PM bater e prender trabalhador@s da educação infantil.
A cartilha de repressão e perseguição política é a mesma no Paraná de Beto Richa (PSDB). Após enfrentarem mais de 3 horas de bombas e tiros de bala de borracha, num verdadeiro cenário de guerra, no massacre de 29 de Abril de 2015, que resultou em mais de 200 trabalhador@s feridos, @s trabalhador@s da educação paranaenses seguiram sendo atacad@s por Richa e seus aliados. Após a massiva ocupação de escolas no estado, vários trabalhador@s tiveram processos administrativos abertos por “incitar e incentivar” estudantes a ocuparem suas escolas, corte de ponto em manifestações da categoria que exigiam direitos, sofreram assédio moral por parte dos núcleos de educação e direções escolares ligadas ao governo, etc.
Sandra Fortes, militante do GOI, professora no município de Taboão da Serra (região metropolitana de São Paulo), também sofreu as duras consequências da perseguição política e do assédio moral desencadeados pelo prefeito Fernando Fernandes, do PSDB, sendo processada injustamente e transferida compulsoriamente da escola onde trabalhava, após uma greve do funcionalismo municipal realizada em 2015. Em 2017, as trabalhadoras do quadro de apoio do magistério de Taboão fizeram uma nova greve de 62 dias para cobrar reajuste nos salários congelados há anos e até vale transporte que o governo não paga, enfrentando o descaso do governo e o corte de salários.
A quem serve o desmonte da educação pública?
Embora as lutas travadas internacionalmente contra o desmonte da educação pública demonstrem a disposição d@s trabalhado@s em enfrentar os governos, sob o sistema capitalista a educação pública está fadada ao fracasso. O desmonte proposital da educação pública tem como objetivo a privatização em benefício dos grandes grupos empresariais que já lucram e irão lucrar ainda mais quando, finalmente, conseguirem impor seu modelo de educação, tornando o ensino uma ferramenta para a massificação de mão de obra barata, proibindo discussões de gênero e opressões nas salas de aula, calando educador@s com projetos como o “Escola Sem Partido” (ou “Lei da Mordaça”), perseguindo e reprimindo de forma truculenta as lutas d@s trabalhador@s em defesa da educação pública.
Recentemente, o grupo Kroton, maior empresa no ramo educacional privado do Brasil, adquiriu o grupo Somos Educação pela fortuna de R$ 4,6 bilhões. Essa informação é importante, pois nos dá a dimensão de como a burguesia lucra com o fracasso do modelo público burguês de educação. O grupo Kroton é hoje o principal interessado na reforma e privatização do Ensino Médio, que tem no governo tucano de Alckmin no estado de São Paulo um dos principais exemplos no país.
A CUT precisa mobilizar seus sindicatos numa luta nacional em defesa da educação pública
Infelizmente, temos visto as direções cutistas, que continuam sendo as principais direções dos sindicatos do setor da educação no país e da CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, se dedicarem mais ao papel de intermediadores dos governos e patrões, do que efetivamente construindo as lutas da categoria. No Paraná, recentemente, a direção da APP terminou uma reunião de cúpula com a nova governadora, Cida Borghetti (PP, ex-vice de Richa), sorrindo para as câmeras, ao lado de uma inimiga declarada da educação. Em São Paulo, a direção da Apeoesp arbitrariamente cancelou, sem consultar a base, a assembleia d@s trabalhador@s da educação no último dia 06/04, para se deslocar para São Bernardo do Campo na resistência contra a prisão de Lula. Embora achemos válida a mobilização feita em São Bernardo do Campo, o método utilizado pela direção da Apeoesp demonstra a incapacidade de correlacionar às lutas da classe com a liberdade de Lula, causando na base desconfiança, despolitizando um debate necessário para a reorganização da categoria.
É imprescindível que a base que está sob a direção cutista pressione seus sindicatos a se posicionarem contra as truculências de governos petistas e a se dedicarem a construir uma forte mobilização da educação em nível nacional, unificando as lutas em curso, para enfrentar a implementação da reforma do ensino médio, o avanço dos projetos “Escola sem partido” e o sucateamento e privatização da educação pública.
O papel antioperário do PT e a tarefa da militância
A direção do PT vem se utilizando de dois pesos e duas medidas, ao denunciar a arbitrariedade da prisão de Lula, mas seguir alinhada aos planos da burguesia, atacando o funcionalismo público nos estados e municípios onde governa. O caso mais recente é o já citado do governador petista de Minas Gerais, Fernando Pimentel. A militância petista não pode tolerar isso! Lutar pela democrática bandeira da liberdade de Lula passa também por estar com o conjunto da classe, sem aliança com os patrões, em suas lutas e mobilizações. O que Pimentel fez em Minas Gerais, assim como a proposta de militarização das escolas públicas feita pelo governador petista da Bahia, Rui Costa, precisam ser repudiados pela militância, que deve exigir de Lula e da direção petista que rompam com a burguesia e construam imediatamente a unidade da classe trabalhadora para derrotar os ataques de Temer e dos governos estaduais e municipais, inclusive exigindo a libertação imediata de Lula.
A saída que propomos à militância do PT e também ao conjunto dos ativistas que lutam contra os governos e patrões é construir nas ruas a unidade da classe trabalhadora, sem patrões, para enfrentar os novos ataques que virão! Mas, para isso, é preciso que a CUT e o PT, que seguem sendo as principais direções do movimento organizado d@s trabalhador@s, particularmente na Educação, devem romper seus pactos e governos com a burguesia e os partidos patronais.
Construir um modelo socialista de Educação Pública
A grande mobilização dos estudantes secundaristas contra a MP da Reforma do Ensino Médio e a PEC 241 (do “Fim do Mundo”), em 2016, demonstrou, para além da insatisfação com o modelo proposto por Temer, também uma insatisfação com o modelo de educação vigente. As ocupações colocaram na ordem do dia a construção de um modelo socialista e democrático de Escola Pública. Estudantes, em sua maioria mulheres, negros e negras e LGBTTIs, mobilizaram educador@s, comunidade e a sociedade para refletir sobre os problemas enfrentados na educação pública e com soluções práticas e democráticas organizaram debates calorosos durante as ocupações para discutir temas considerados importantes para el@s. Dinamização do ensino, debates sobre inclusão e diversidade, o papel da educação na construção de uma sociedade sem exploração e preconceito e a laicidade, gratuidade e universalidade do ensino foram os temas mais pertinentes questionados. Os estudantes, também, deram uma aula de resistência e autodefesa contra a PM e setores da ultradireita ligada ao MBL, que se propagavam como os paladinos defensores da “educação” durante as ocupações.
Este ano acontece o III Encontro Nacional da Educação (ENE). Essa é uma ferramenta importante, construída pela vanguarda da esquerda socialista, para debater os problemas e o sucateamento enfrentado principalmente nas universidades públicas brasileiras. O III ENE irá acontecer numa conjuntura de duros ataques à educação e de importantes mobilizações do setor. É necessário que o III ENE amplie sua discussão sobre a necessidade um modelo socialista de educação e seja a ponte para a construção nacional de uma Frente Nacional de Luta Em Defesa da Educação Pública, unificando estudantes e trabalhador@s numa luta comum.
“Sejamos realistas, exijamos o impossível”
2018 marca os 50 anos da revolta estudantil e popular na França conhecida como “Maio de 68”. A rebelião iniciada nos corredores das universidades francesas, que tomou conta das ruas e ganhou a adesão da classe trabalhadora, abalou a estrutura autoritária da educação vigente até aquele momento. Maio de 68 ecoa até hoje nas lutas da juventude e dos setores oprimidos, por exigir mais liberdades, direitos civis e propor a ruptura do modelo de educação pré-estabelecidos por uma sociedade conservadora. Sob o espírito revolucionário da juventude francesa, das experiências acumuladas nas lutas internacionais da educação e do ascenso vivido pelo setor, devemos construir a unidade d@s trabalhador@s e d@s estudantes por uma educação pública, plural, gratuita e de qualidade!