Célia Souza
A morte da Rainha Elizabeth II, aos 96 anos de idade, neste 8 de setembro/22, encerra o mais longo de todos os reinados da História (1952-2022), superando o da Rainha Vitória (1837-1901), responsável por devastar boa parte das riquezas da África e da Ásia, em disputa com vários países imperialistas. Deixando para trás um legado de violência e opressão jamais superado, como em outros tempos assim também fizeram todos os representantes dessa coroa, em inúmeros territórios, com igual obstinação.
Diante das homenagens que lhes são destinadas por súditos, chefes de Estado e demais interessados em ampliar as cifras dos países aos quais representam, escamoteia-se a verdade a despeito do quanto essas alianças espúrias renderam e rendem em milhares de euros, dólares, libras esterlinas e tantas outras moedas em nome do acúmulo de riquezas construídas pelo império britânico, que durante sua fase expansionista promoveu a alteração das demarcações naturais dos territórios dominados, provocando guerras fratricidas entre as nações estabelecidas há séculos naquelas regiões, a fim de criar fronteiras artificiais onde impuseram total controle político e exploração das riquezas naturais, por meio do trabalho análogo à escravidão dos habitantes locais.
Assim fizeram com inúmeras nações, não só com a africana, mas também à asiática e americana (essa entre os séculos XVI ao XVIII). Este modelo de colonização lançou milhares de vidas à fome, às doenças, à morte e ao esquecimento histórico, lembrando também os episódios ocorridos no pós Segunda Guerra Mundial (1939-1945), sob o reinado da Rainha Elizabeth II, entusiasta dos massacres desferidos pela Inglaterra contra os povos africanos e asiáticos.
O funeral midiático, apesar das “pompas” e gastos astronômicos, jamais enterrará os princípios, que de fato representam os propósitos da nobreza e de seus bajuladores, ao esbanjar fortunas milenarmente roubadas, sob o estandarte da realeza, que neste cenário serve como o manto que recobre o caixão milionário da Rainha, “Vossa Majestade” para muitos que acreditam numa bondade que jamais existiu da parte dos membros de qualquer dinastia monárquica deste planeta. Quanta ingenuidade ou alienação povoa a mentalidade de uma parcela significativa da população inglesa e dos arredores.
Ao longo dos 70 anos e alguns dias deste reinado, o incentivo à permanência do domínio colonialista britânico e do apartheid na África do Sul, objetivava negar quaisquer direitos ao povo trabalhador, que vivia submetido a um regime segregacionista, que lhes negava o direito à educação e moradia dignas, além do uso obrigatório de um crachá que identificava cada etnia. Caso algum trabalhador pertencesse às etnias consideradas rebeldes, passaria a receber castigos de diversas naturezas, inclusive os açoites. A mesma opressão ocorria contra todos os povos submetidos ao Império Britânico, como o povo palestino e tantos outros.
Foram décadas de lutas dos povos asiáticos e africanos, desde a instalação do neocolonialismo (século XIX), período em que a industrialização europeia passou a se impor sobre estes continentes marcando o início do novo modelo de exploração imperialista. Todas estas lutas enfrentaram o Império Britânico, que após a perda da hegemonia mundial para os Estados Unidos, passaram a ser o braço direito do imperialismo ianque, como recentemente nas guerras contra o Iraque e o Afeganistão.
Histórias de mesmo teor se repetiram em outros países e continentes, por essa rainha e por outros anteriores a ela, com igual interesse, cuja finalidade era oprimir e submeter o povo trabalhador das incontáveis regiões exploradas a condições degradantes, com a anuência de governos traidores, para assim expropriar-lhes as riquezas materiais e sua condição de humanidade.
Mesmo diante dessa realidade incontestável, perpetrada pela realeza britânica, ao longo de toda sua existência, marcada pela violência na construção de um Império que se manteve às custas de sangue, expropriações, mortes e todos os tipos de mazelas impostas sob guerras que destruíram e violaram soberanias, boa parte da classe trabalhadora inglesa se rendeu diante do leito de morte da Rainha. A burguesia britânica manipula os sentimentos da classe trabalhadora com o objetivo de desviar a atenção da grave crise do país, e para tentar fortalecer o regime político.
Levando em conta que a realeza britânica consome 50 milhões de euros anuais para manter o luxo, a segurança e suas condições de superioridade, e mesmo diante de uma inflação galopante, que não se via há pelo menos quatro décadas, corroendo salários e devastando o poder de compra da classe trabalhadora, estabeleceu-se a opção por um funeral que custou 0,8% do PIB trimestral da Inglaterra.
Foram 11 dias de luto e peregrinação absolutamente desnecessária pelas cidades, onde multidões se amontoaram para visitar um caixão lacrado, com os símbolos da arrogância e soberania monárquica (a coroa e o estandarte da realeza) à mostra, se sobrepondo às dificuldades impostas ao povo pela crise econômica.
Poucos conseguiram refletir racionalmente sobre o desprezo com o qual estão sendo tratados, tendo em vista a imensa fortuna destinada a um cerimonial que vale mais que um prato de comida aos desempregados e famintos que se multiplicam pelo país.
No entanto, houve uma parcela significativa de 20% da população que se colocaram contrários aos gastos exorbitantes com o velório e o enterro da Rainha, questionando este evento midiático em plena crise econômica mundial, que se reflete na Inglaterra por três anos consecutivos. Não sendo aceitável tamanha irresponsabilidade, seguirão denunciando tais atitudes inconsequentes confrontando as atitudes arbitrárias da monarquia.
Sinal de que ainda há consciência de classe, racionalidade e alguns que jamais permitirão o apagão que os poderosos pretendem impor à força e por meio de apelo emocional, às barbáries cometidas pelos grupos dos poderosos, representantes do capital.
É absolutamente necessário manter acesa a chama das lutas contra opressão e por um Estado que seja criado e governado pela classe trabalhadora.
Fontes da Imprensa