Por Marjane
Semana passada, os professores da Rede Estadual de Ensino de São Paulo enfrentaram uma maçante jornada de quatro horas diárias de planejamento online com assuntos demasiadamente repetitivos e cansativos. O objetivo do planejamento foi preparar os professores para o segundo bimestre, mesmo sabendo que a maioria dos estudantes não possuem recursos suficientes ou nenhum recurso tecnológico para acompanhar as aulas remotas.
Como se não bastasse todo o discurso falacioso e excludente da Secretaria Estadual de Ensino de São Paulo, dois conhecidos “pensadores midiáticos” foram contratados para ratificar esse discurso – Leandro Karnal e Mário Sérgio Cortella.
Por trás de falas motivadoras e de autoajuda que tentam dar aos professores uma capa de herói, existe a intenção de silenciar suas vozes e fazer com que eles se adaptem às mais adversas e cruéis situações de trabalho.
Quando Leandro Karnal [que costumo chamar de Youtuber de gravata] diz que um bom professor é capaz de lecionar até debaixo de uma árvore, ele indiretamente induz os educadores a tomarem uma postura resignada diante do desmonte da educação pública não só em São Paulo, mas em todo território nacional. Além disso, também faz com que o profissional da educação venha crer que o sucesso ou o fracasso do sistema educacional está atrelado exclusivamente ao seu desempenho. Tirando, portanto, a responsabilidade do estado de cumprir suas obrigações que vão desde a remuneração digna dos professores até escolas bem equipadas.
A resiliência/resignação proposta aos professores nesse momento de pandemia tem o intuito de nos fazer esquecer os problemas gritantes, aos quais estamos expostos. Querem que passemos por cima de milhares de mortes, do crescente desemprego, do adoecimento de familiares e amigos, do stress, da jornada extenuante de trabalho, dos conflitos psicológicos nossos e dos nossos alunos e de toda comunidade escolar para sermos heróis e heroínas e levarmos adiante o projeto de sucateamento da educação – o verdadeiro apartheid educacional, uma vez que as escolas da burguesia estão anos luz das escolas públicas.
Obviamente, que não devemos deixar de nos dedicarmos como professores! Continuemos, sim, a nos dedicarmos à educação para formarmos jovens questionadores que não se curvem ao descaso e às injustiças sociais! Mas não podemos nos resignar, não podemos aceitar a alcunha de heróis e, simplesmente, isentar o poder público de suas responsabilidades. Não podemos aceitar que boa parte dos alunos não tenham acesso à educação nesse momento! Inclusive, esse deveria ser um papel exercido por esses “Youtubers de gravata” que dizem defender a educação. É incoerente ter um discurso pró-educação e discursar num canal agenciado por um governo que há anos vem provendo o sucateamento de escolas, que há anos desrespeita professores e alunos, que nunca teve real compromisso com a educação. E eles sabem disso!
Sigamos o exemplo recente dos profissionais da saúde que negaram o rótulo de heróis e exigiram melhores condições de trabalho.
É importante a nossa organização e a nossa luta por condições dignas de trabalho.
Marjane é professora da Rede Estadual de Ensino de SP